sexta-feira, 13 de julho de 2007

Os metecos ...


Então, pelo sobrenome, pela origem, pela cor, pelo tipo físico ou jeito de ser, qualquer um acaba vivendo algum exílio injusto e particular. (Lya Luft)

A primeira vez que me defrontei com a palavra foi em uma música de Georges Moustaki, cantor que fez algum sucesso na França nos anos 60-70. Ele é pouco conhecido por aqui, embora esteve algumas vezes no Brasil e é um apaixonado pela música brasileira, da qual incluiu várias em seu repertório. Para mim, ele é alguém especial por ter nascido em Alexandria, no Egito, cidade onde vivi minha juventude. Ele frequentou inclusive a mesma escola.

Mas o que é um meteco? Diz o dicionário : um estrangeiro domiciliado em um pais.

Entendo a sua música e sua tristeza. Nascemos em um pais, o Egito, que não era o nosso. Éramos cristãos em uma terra de muçulmanos. Éramos europeus cosmopolitas, falando várias linguas europeias, em um pais de fala árabe, um povo pobre, com uma herança maravilhosa mas que havia sido completamente dilapidada e destruída, só restando miséria e descultura.

Tínhamos nossos bairros, nossas escolas, nossas igrejas e até nossas praias. E o povo local tinha costumes que considerávamos muito primários e uma cultura bastante atrasada. E uma falta de higiene bastante característica que funcionava como uma enorme e intransponível barreira, bem acima de quaisquer outras divergências de cunho religioso ou social.
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E é lógico, havia muita segregação. Diria que tácitamente aceita e de parte a parte : tanto é que nunca prevaleceu a jus soli e era totalmente normal que, mesmo após um número grande de gerações, filho de estrangeiro, continuasse estrangeiro.

Creio que sinceramente desejávamos continuar assim, mas permanece o fato que, assim mesmo, nós éramos metecos e de certa forma, isolados.
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Com as reviravoltas da política local, ao final dos anos 50, os metecos saíram do Egito : havia italianos, franceses, gregos, malteses, uma variedade de raças e de religiões : todos invariavelmente nascidos lá, e radicados lá, há várias gerações, diga-se de passagem!. Se espalharam pelo mundo. Alguns foram para os paises do futuro e da esperança : Australia, Canadá, Brasil, Estados Unidos. Outros para os países de origem de seus antepassados ou de sua predilação que os quizessem receber.

Continuaram metecos. Falavam vários idiomas e não foi difícil aprender mais um novo. Estavam habituados à diversidade de costumes, também não foi difícil se adaptarem, como soi a um bom e sólido meteco.

E metecos permaceram, gente longe de suas raízes, de seus amigos de infância, dos costumes de um ambiente cultural único, restrito e irremediavelmente extinto.

Passaram-se os anos, casaram, tiveram filhos e netos.

E hoje, ainda, na realidade, continuam metecos, uma espécie de nomades, diluídos e invisíveis na paisagem urbana, sim; ... mas uns personagens, no fundo, um tanto estranhos. Presentes mas não totalmente pertinentes, com uma série de idiossincrasias na forma de pensar, uns gostos um tanto peculiares e uma saudade de uma filosofia de vida que eles trazem de um mundo só seu, que não existe mais, vivendo, como bem diz Lya Luft, seu exílio particular.

4 comentários:

marianicebarth disse...

Turini, parabéns pelo texto! De todos foi o que mais me falou ao coração, pois também me sinto meio como uma meteca (pode feminino?).
O termo vem do grego metoikos e eu não conhecia. Graças a você, procurei no dicionário e acrescentei uma palavra ao vocabulário pessoal.
Só que eu era "meteca em família", criada pela família de meu tio-avô. Era e não era da família e sei muito bem como se sente um meteco. Tinha mãe e pai casados (mas separados quando nasci) e mais duas irmãs, Carmen e Diva.
É uma estranha situação, cheia de sentimentos e desejos de aceitação ou de não-aceitação;
Mas você ainda se considera um estrangeiro aqui? Turini é italiano, certo? O Brasil é ótimo em aceitar metecos, você não acha?

Polemikos disse...

Ah! Não tem nada a ver com o Brasil. O Brasil nos recebeu de braços e coração abertos. O Brasil é nossa Patria e posso lhe assegurar que podemos ser mais chauvinistas que os próprios nascidos no Pais.

Fiz 50 anos de Brasil no último mês de Maio e me orgulho disto. Não me considero um estrangeiro ... para tanto, um enorme contingente de brasileiros tambem teriam que se sentirem estrangeiros, não é mesmo. Estou totalmente adaptado e integrado. E feliz com isto.

A única coisa que não consegui ainda apreender/incorporar (e é uma enorme frustação) ... é gostar de futebol, com esta paixão avassaladora que suplanta tantos pequenos incomodos do dia-a-dia.

marianicebarth disse...

Então não sou brasileira da gema, daquelas verdadeiras, porque também não sou fanática por futebol. Lembra do meu pênalti? Por pura ignorância...

irmãcaçula disse...

Para ser "brasileira da gema" tem que gostar de futebol? De todos os campeonatos ou Copa do Mundo? Só gosto desta e se os jogadores realmente fizerem por merecer; aliás, acho um absurdo o que alguns ganham sem fazer nenhum esforço.